A história do al-Andalus não foi apenas construída por prodigiosos vultos, mas também por pequenos poetas que não deixariam de expressar, através dos seus versos, os sentimentos e as vivências que fizeram parte da sua existência.
Abdalá Ibne Uázir (também denominado como Abdallah ibn Wazir) é certamente um desses exemplos. Infelizmente, não logramos reunir muitas informações sobre a sua vida, mas ainda assim compilámos alguns elementos biográficos.
De acordo com o especialista em estudos islâmicos, António Borges, o biografado pertenceria à família dos Banu Uázir de Beja. No auge da sua carreira, terá desempenhado as funções de alcaide (estatuto equiparável ao de governador) na praça muçulmana de Alcácer do Sal (al-Qasr).
Em 1217, Abdalá Ibne Uázir é surpreendido pela chegada das tropas de D. Afonso II (embora o rei português não tivesse estado presente no empreendimento militar) que são engrossadas por um importante exército de cruzados (sendo que estes, na sua maioria, seriam combatentes germânicos e flamengos que estavam integrados na campanha da Quinta Cruzada que deveria rumar ao Egipto). Apesar de quatro soberanos muçulmanos (provenientes de Sevilha, Córdoba, Jaén e Badajoz) terem vindo em auxílio do governador islâmico de Alcácer, a verdade é que estes foram derrotados pelos cristãos numa batalha travada no exterior. Os muçulmanos que resistiam a partir da guarnição da praça não tiveram outra hipótese senão apresentarem a sua rendição diante dos novos invasores. Confrontado com a nova realidade, Abdalá Ibne Uázir simulou uma conversão ao cristianismo, de forma a tentar ludibriar os novos ocupantes da cidade. Pouco tempo depois, e logo que teve oportunidade, conseguiu fugir para o Garbe Muçulmano.
Pelo que apuramos, este oficial administrativo não se inteirou apenas da gestão financeira, política, judicial e militar da sua praça, como parece também ter velado pela cultura a nível local. Abdalá Ibne Uázir não era um governante ignorante que não sabia ler ou escrever, como acontecia recorrentemente na distendida Idade Média. O analfabetismo atingia números assombrosos, sendo transversal ao povo e até à própria nobreza. Apenas as pessoas ligadas ao clero (independentemente do credo professado) e alguns profissionais liberais (caso dos magistrados) detinham alguns conhecimentos linguísticos porque tal seria fundamental para o exercício das suas funções.
Abdalá Ibne Uázir era portanto uma feliz excepção à regra, uma personalidade digna de integrar uma minoria de intelectuais da sua época, mesmo que a sua obra literária não tivesse sido uma das mais marcantes do al-Andalus.
O alcaide foi efectivamente um poeta. Os seus versos visavam, em especial, a realidade envolvente. Aliás, a crítica social e política do seu tempo estão implícitos ao longo da sua obra. Mas num dos seus poemas, Abdalá mostra-nos também um lado mais humanista, e inclusive amigo dos animais, visto que chegara a confessar a sua tristeza pelo facto de o seu cão de caça ter morrido durante uma caçada nas florestas de Alcácer.
Infelizmente, não temos mais dados a reportar sobre a sua vida. Contudo, conseguimos encontrar um pequeno poema da sua autoria onde nos é revelado um pouco da sua tendência para a sátira social.
Até porque a poesia não se refugia apenas nos enclaves sentimentais do amor, da tristeza ou da amizade, assumindo-se igualmente como uma ferramenta capaz de denunciar vícios e abrir novos caminhos mais luminosos para as sociedades que lhe são contemporâneas!
De acordo com o especialista em estudos islâmicos, António Borges, o biografado pertenceria à família dos Banu Uázir de Beja. No auge da sua carreira, terá desempenhado as funções de alcaide (estatuto equiparável ao de governador) na praça muçulmana de Alcácer do Sal (al-Qasr).
Em 1217, Abdalá Ibne Uázir é surpreendido pela chegada das tropas de D. Afonso II (embora o rei português não tivesse estado presente no empreendimento militar) que são engrossadas por um importante exército de cruzados (sendo que estes, na sua maioria, seriam combatentes germânicos e flamengos que estavam integrados na campanha da Quinta Cruzada que deveria rumar ao Egipto). Apesar de quatro soberanos muçulmanos (provenientes de Sevilha, Córdoba, Jaén e Badajoz) terem vindo em auxílio do governador islâmico de Alcácer, a verdade é que estes foram derrotados pelos cristãos numa batalha travada no exterior. Os muçulmanos que resistiam a partir da guarnição da praça não tiveram outra hipótese senão apresentarem a sua rendição diante dos novos invasores. Confrontado com a nova realidade, Abdalá Ibne Uázir simulou uma conversão ao cristianismo, de forma a tentar ludibriar os novos ocupantes da cidade. Pouco tempo depois, e logo que teve oportunidade, conseguiu fugir para o Garbe Muçulmano.
Pelo que apuramos, este oficial administrativo não se inteirou apenas da gestão financeira, política, judicial e militar da sua praça, como parece também ter velado pela cultura a nível local. Abdalá Ibne Uázir não era um governante ignorante que não sabia ler ou escrever, como acontecia recorrentemente na distendida Idade Média. O analfabetismo atingia números assombrosos, sendo transversal ao povo e até à própria nobreza. Apenas as pessoas ligadas ao clero (independentemente do credo professado) e alguns profissionais liberais (caso dos magistrados) detinham alguns conhecimentos linguísticos porque tal seria fundamental para o exercício das suas funções.
Abdalá Ibne Uázir era portanto uma feliz excepção à regra, uma personalidade digna de integrar uma minoria de intelectuais da sua época, mesmo que a sua obra literária não tivesse sido uma das mais marcantes do al-Andalus.
O alcaide foi efectivamente um poeta. Os seus versos visavam, em especial, a realidade envolvente. Aliás, a crítica social e política do seu tempo estão implícitos ao longo da sua obra. Mas num dos seus poemas, Abdalá mostra-nos também um lado mais humanista, e inclusive amigo dos animais, visto que chegara a confessar a sua tristeza pelo facto de o seu cão de caça ter morrido durante uma caçada nas florestas de Alcácer.
Infelizmente, não temos mais dados a reportar sobre a sua vida. Contudo, conseguimos encontrar um pequeno poema da sua autoria onde nos é revelado um pouco da sua tendência para a sátira social.
Até porque a poesia não se refugia apenas nos enclaves sentimentais do amor, da tristeza ou da amizade, assumindo-se igualmente como uma ferramenta capaz de denunciar vícios e abrir novos caminhos mais luminosos para as sociedades que lhe são contemporâneas!
"Não desesperes"
Não desesperes de chegar a califa
Pois Ibne Amr foi nomeado inspector das alfândegas.
Desgraçada época em que se fazem coisas
Como esta:
Colocar altos cargos nas mãos de um limpador
De esgotos.
Versos da autoria de Abdalá Ibne Uázir
(Poema compilado e preservado pelo historiador Ibne Saide Al-Magribi)
Posteriormente traduzido por Teres Sàdaba (espanhol) e Garcia Domingues (português)
Imagem nº 1 - A Poesia e a Música constituíram partes integrantes do dinamismo evidenciado por alguns centros culturais do al-Andalus.
Referências Consultadas:
- COELHO, António Borges - Portugal na Espanha Árabe. Vol. IV. Lisboa: Seara Nova, 1975.
- DOMINGUES, Garcia - Património Cultural Arábico - Algarvio. Lisboa: Casa do Algarve, 1956.
- SÁDABA TERÉS, Elías; GARCIA GOMEZ, Emilio - Los Manuscritos árabes de la real academia de la Historia. Madrid: Real Academia de la Historia, 1975.
- http://alcacer-moderna-contemporanea.blogspot.com/2006/11/o-cancioneiro-do-sadojornal-pedro.html, (Consultado em: 24-01-2017).
Quando nos referimos no título ao "derradeiro poeta muçulmano" obviamente nos referimos apenas a Alcácer do Sal, praça definitivamente conquistada pelos cristãos em 1217.
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