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quarta-feira, 30 de julho de 2014

O Legado dos Maias

Contexto Temporal e Geográfico

Os Maias, os Incas e os Astecas constituem as três grandes civilizações pré-colombianas (ou seja, já existiam antes da chegada de Cristóvão Colombo) que atingiram o maior grau de desenvolvimento no Continente Americano. Apesar de terem partilhado muitas práticas semelhantes, a verdade é que pretenderemos agora abordar o caso concreto dos Maias.
As origens deste misterioso povo remontariam a 500 a. C. e o término do seu império situar-se-á talvez nos séculos VIII ou IX. Estamos perante uma baliza cronológica de quase 1500 anos. Os seus domínios alastravam-se desde o Guatemala até uma grande parte do sul do México, destacando-se assim na região que praticamente corresponde hoje à América Central.
As principais cidades-estado maias eram: Piedras Negras, Palenque, Tikal, Yaxchilán, Copán, Chichen Itzá, Uxmal e Labná.




Imagem nº 1 - Mapa onde se pode ver a tracejado vermelho a região onde estava concentrada a civilização maia. Actualmente, esta extensão incorpora o Guatemala, Honduras, Belize, El Salvador e Sul do México.



A Sociedade e Economia Maia


Os Maias possuíam a sua própria estratificação social. No topo, estavam evidentemente o soberano e sua família que tutelavam os destinos de cada cidade independente. O monarca era divinizado visto que a sua personalidade era parte integrante do cosmos universal e, por isso, tornava-se num senhor absoluto, para além de ser visto como um emissário do espaço celestial (era um mediador junto dos deuses) e dono dos homens e das terras. O seu cargo era transmitido hereditariamente por sucessão masculina directa.
Seguiam-se depois as linhagens nobiliárquicas que detiveram o prestígio sacerdotal, impuseram ainda a sua autoridade sobre núcleos residenciais (ou centros menores) e revelaram assim a sua vocação dirigente. Por outras palavras, a nobreza-sacerdotal contribuía para a manutenção da ordem e zelava ainda pela faceta religiosa. Normalmente, era constituída por familiares do monarca que acumulavam neste sector aristocrata os principais cargos administrativos, políticos, militares ou religiosos na cidade-estado. Eram eleitos pelo rei. Conhecem-se alguns dos cargos ocupados: Batah (chefe local de designação real), Ah Cuch Cab (regedor que cobrava tributos e prestações de serviços), Halpop (delegado do poder real para conselho nas assembleias locais e encarregado das relações com centros vizinhos), Tupil (polícia vigilante da ordem nos povoados), Nacom (chefe temporário do exército), Ahau cati (sacerdote principal - cargo hereditário), Chilam (espécie de sacerdote popular que profetizava). Para além destes ofícios, também os mercadores (transmitiam sempre o cargo aos seus descendentes) integravam a linhagem nobre, sendo que esta tinha ainda acesso aos estudos astronómicos, médicos e científicos em geral.
O povo, correspondente à maior parte esmagadora da população total, tinha que se submeter a esta ordem social e religiosa. Aqui estavam inseridos os camponeses, oleiros, escultores, pedreiros, carpinteiros, pintores, tecelões, escribas e até muitos dos guerreiros que participavam em acções de conquista ou nos confrontos entre as cidades independentes.
Por fim, e no fundo desta hierarquia, estariam os escravos (domésticos, ao serviço das principais famílias; ou reduzidos a esta posição através duma pena firmada por delitos cometidos; ou capturados em guerra) que constituíam uma mão-de-obra a ter em conta.
A ascensão social era diminuta ou quase inexistente, tal como constatamos nas restantes civilizações das eras antiga e medieval. A hereditariedade ditava o futuro de qualquer pessoa. Por exemplo, o filho dum agricultor seguiria pois mais tarde as pisadas do seu progenitor.
A propriedade da terra maia era comunitária, e seria o chefe da aldeia que determinaria a parcela que seria atribuída a cada família que, normalmente, dispunha da sua pequena horta.
Efectivamente, em termos agrícolas, conheceram-se algumas plantações estáveis de algodão, cacau, tabaco, milho, feijão, cabaça, juca, pimento, tomate, sapota, pasto, frutos vários, sementes e tubérculos silvestres. Os Maias recorriam ainda à caça, pesca e exploração de colmeias.
O comércio era rudimentar, e por isso, não existiam praticamente grandes mercados locais. Por isso, o intercâmbio de produtos parecia ser bastante limitado.
Em termos religiosos, a sociedade maia acreditava numa ordem superior, valorizava o estudo e a interpretação do cosmos, nomeadamente o movimento dos astros, e debruçava-se sobre as artes de adivinhação e profecia. Os principais deuses adorados eram: Itzam Na (Deus criador do céu e da terra, ora representado como um réptil ora na sua forma humana como ancião), Kinich Ahau (Deus do Sol), Ix Chel (Deusa da Lua e protectora das relações sexuais, da procriação e dos partos), Chac (Deus da Chuva) Ah Mun (Deus do Milho), Ah Puch (Deus da Morte representado como um esqueleto com manchas negras e amarelas, de influência maligna), Tox (Deus da Guerra), entre outros. Decorriam mesmo sacrifícios humanos de forma a agradar a estas divindades superiores, muitas delas conotadas com a Natureza.




Imagem nº 2 - O Deus Criador do Céu e da Terra, na perspectiva dos Maias.
Retirada de: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Itzamna-Lawrie-Highsmith.jpeg, a escultura foi da autoria do artista Lee Lawrie (1877–1963).




Imagem nº 3 - A Civilização Maia obedecia a uma hierarquia social rígida.



Cultura Maia

A civilização maia evidenciou-se, de entre as culturas do Novo Mundo (ou do continente até então escondido aos olhos dos europeus), em variadas vertentes:

- Desenvolveram a Escrita Hieroglífica que assentaria em relevos, pinturas e códices. Esta estaria mais conotada com o contexto sagrado.
- Instauraram um Calendário rigoroso de 365 dias que resultava da vasta experiência na observação dos astros, demonstrando assim, nesta área, uma interpretação avançada em comparação com outros povos antigos.
- Promoção duma Arquitectura que proporcionou a existência de grandes edifícios. Foram erguidos templos piramidais, palácios, residências para as elites, altares sobre plataformas e outras estruturas curiosas,
- Construíram-se ainda aquedutos, reservatórios, saunas, calçadas de pedra em plena floresta, fossas e trincheiras.
- Dinamizou-se a Escultura que servia de veículo para a glorificação do monarca e expressão da sacralidade. Encontramos estelas, altares, lápides, dintéis, planos verticais, jambas, tronos, estatuetas de divindades e figuras humanas/animais, e imagens zoomórficas.
- Estimularam a Pintura que dispunha de variados cenários murais em palácios e pirâmides.
- Mantiveram a Cerâmica com grande diversidade formal. Foram encontradas peças de quatro pés, pratos, taças e vasos cilíndricos. Estava frequentemente conotada com o culto real.
- Aplicaram a música (foram achados instrumentos de sopro e percussão), os cantos religioso e festivo, e a dança.
- Desenvolveram um sistema de numeração que já incluía o conceito "zero".
- Praticaram jogos de bola, nomeadamente o jogo da péla. O objectivo passaria pela utilização duma bola de borracha que teria de atingir o aro ou os marcadores do jogo. Caso o participante fracassasse, seria executado. Muitas cabeças foram decapitadas em jeito de ritual de sacrifício humano, e estas até chegaram a ser utilizadas para substituir a bola de borracha no decurso da partida.



Imagem nº 4 - Os Maias possuíam a sua própria escrita que se pautava pelo seu simbolismo. Esta placa encontra-se no Museu das Ruínas de Palenque - Chiapas (México).
Retirada de: http://historiasylvio.blogspot.pt/2012/11/maias.html, (Imagem: 1000dias.com)




Imagem nº 5 - Códice Maia guardado no Museu Nacional de Antropologia - Cidade do México (México).
Retirada de: http://historiasylvio.blogspot.pt/2012/11/maias.html, (Imagem: 1000dias.com)



Imagem nº 6 - Estelas Maias situadas nas Ruínas de Copan, quase na fronteira entre as Honduras e o Guatemala.




Imagem nº 7 - O aro lateral ou anel de pedra do jogo da péla. A bola tinha de entrar no meio para que o participante fosse pontuado. Este jogo de bola mesoamericano estava associado ao ritual religioso.




Imagem nº 8 - O jogo de bola maia determinou o destino de várias vidas.





Imagem nº 9 - Pirâmide Maia de Chichen Itza (estado de Yucatán - México).
Retirada de: http://beautifulplacestovisit.com/ruins/chichen-itza-yucatan-mexico/, (foto da autoria de Raúl López/Tony Shuck).



Imagem nº 10 - Cidade Maia de Tikal (Guatemala).



Fim do Império Maia

Corria o século IX, quando, em pouco tempo, todas as cidades-estado maias foram abandonadas, excepto as da região norte de Yucatán. Ao contrário do que muitos possam julgar, a civilização maia não desapareceu totalmente, até porque ainda hoje existem tribos descendentes. Mas o Império Maia, esse sim, sumiu de vez.
Ainda hoje se debatem as causas reais que levaram ao declínio imediato e misterioso desta civilização. Podemos avançar algumas hipóteses para o sucedido (cremos que até poderá ter sido a conjugação de todas elas):


  1. Uma longa e destrutiva Seca - Esta teria arrasado facilmente com a maior parte das colheitas, gerando a miséria, fome e grande descontentamento nas comunidades.
  2. Doenças e Pestes - Com a vulnerabilidade no campo alimentar, seria imediata a propagação de enfermidades. A medicina maia era ainda pouco avançada.
  3. Guerras Internas Sangrentas - O descontentamento popular e a ausência da capacidade de resposta, terá propiciado várias revoltas contra os grupos dirigentes. As premissas sociais, outrora intocáveis, começaram a ser colocadas em causa.
  4. Invasões Estrangeiras - Tirando proveito do declínio maia, os povos vizinhos e inimigos avançaram para ocupar novas terras.
  5. Abandono voluntários de muitos maias. Estes tentam escapar ao destino obscuro que possivelmente até teria sido "anunciado" pelos ciclos temporais.
  6. Explosão demográfica resultante dos séculos anteriores. Poderá ter levado ao esgotamento das terras e recursos, e motivado ainda conflitos civis nesta fase atribulada.
  7. A prática da antropofagia (canibalismo) e sacrifícios humanos. Embora este factor não seja por si só suficiente para determinar a decadência dos maias (até é, a nosso ver, um dos factores que teria menor impacto), a verdade é que, mesmo assim, poderá ter tido algum peso. Estas práticas poderão ter aumentado consideravelmente nos tempos mais críticos, de forma a que conseguissem atrair desesperadamente a ajuda divina para contornar a conjuntura cada vez mais nefasta. Para além disso, as guerras internas pareciam ter-se tornado numa prática constante, o que favorece a utilização de prisioneiros para tais fins.

Os Maias, apesar do término do seu auge, deixariam um marco incontornável na História Mundial. Os seus monumentos atestam o esplendor doutros tempos.



Imagem nº 11 - Os períodos de instabilidade vividos por volta de 900 d. C. (séc. IX d. C.) determinaram o desaparecimento do Império Maia.


Referências Consultadas:



Notas Extra:

1- As balizas cronológicas adoptadas para a existência da civilização e império maias motivam ainda várias discussões. Também encontramos autores que situam as origens dos maias algures no decurso do segundo milénio a. C. e que prolongam ainda a sobrevivência de algumas tribos maias até à chegada dos espanhóis. Ou seja, ainda há muito para descobrir em relação a esta civilização.

2- Apesar de utilizarmos o termo "Império", é certo que cada cidade-estado maia era independente e possuía o seu próprio soberano, todavia ao utilizarmos o vocábulo em cima mencionado, estamos efectivamente a referir-mo-nos a todos os aglomerados maias que existiam naquela região da América Central e que partilhavam assim costumes e tradições idênticas. Foi efectivamente este largo conjunto de cidades autónomas que fez perdurar, por muito tempo, esta cultura enigmática.

1 comentário:

  1. Tal como outros artigos este também é interessante. Continue que vale sempre a pena lê-lo. Obrigado.

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