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domingo, 17 de novembro de 2019

As Guerras Imjin (1592-1598): desde a bravura dos samurais até ao apogeu dos barcos-tartaruga coreanos



Contexto

Em finais do século XVI, a Coreia era uma península unificada, estando entregue à dinastia Yi (ou de Joseon; visto que havia sido fundada por Taejo de Joseon) que permaneceria na condução dos caminhos políticos do território entre os anos de 1392 e 1910, isto é, por mais de quinhentos anos. 
As comunidades coreanas dedicavam-se à pesca, à exploração do ferro e da prata, e à agricultura através das plantações da batata, do tabaco, da soja, da cevada e do arroz. 
No século XVI, a Coreia experimentaria alguma instabilidade política com reinados bastante frágeis, muita corrupção e várias intrigas e dissidências políticas na corte. Sempre que um regime ou ciclo governativo cessava, a transição era muitas vezes acompanhada por purgas e traições. 
Na década derradeira de 1590, uma série de acontecimentos exteriores irá precipitar-se sobre o futuro de uma Coreia que se achava já numa situação vulnerável. Dentro deste contexto, Toyotomi Hideyoshi, regente imperial do Japão desde 1585 (unificador da nação nipónica embora tenha ficado também conhecido por se revelar um atroz perseguidor de milhares de cristãos no seu território), decidiu avançar com o sonho de conquistar a eterna rival China. O daimyô nipónico pediu a assistência incondicional da dinastia coreana que deveria permitir a livre travessia dos japoneses e prestar ainda auxílio do ponto de vista militar. Contudo, os coreanos não iriam trair os seus vizinhos chineses, até porque eram vassalos da Dinastia Ming. 
Não digerindo bem a recusa, Toyotomi Hideyoshi convocou os grandes senhores feudais japoneses e as altas patentes do seu exército, e decidiu então empreender uma invasão à Coreia, a qual principiaria em 1592. Seriam seis ou sete anos de elevada tensão militar que, apesar de uma trégua entre os anos de 1593 e 1597, não deixariam de causar uma infinidade de mortes. Apenas no final do ano de 1598, o conflito daria sinais claros de cessação. Até lá, teremos uma imensidão de batalhas e escaramuças que conhecerão múltiplos resultados, entre avanços e recuos por parte das nações em conflito. 





Mapa nº 1 - A Península Coreana e o Arquipélago do Japão desenhados pela cartografia do século XVIII.
Retirado de: http://www.homestaykorea.com/ (Cortesia: Seoul Arts Center)





Imagem nº 1 - Toyotomi Hideyoshi, Regente Imperial do Japão, queria conquistar a China, estando disposto a submeter a Coreia caso esta não colaborasse com o seu projecto militar.
Créditos: Ancient Origins





Imagem nº 2 - O rei coreano Seonjo deixaria ultrapassar-se pelos acontecimentos e assumiria inclusivamente um papel secundário durante as invasões que o seu país enfrentou.




1º Ciclo - O Início da Invasão: Japoneses somam triunfos

Apesar das ameaças de guerra, os coreanos acreditavam piamente que a ofensiva prometida pelos japoneses não iria além das investidas tradicionais de pirataria em alto mar ou junto ao litoral coreano. No entanto, os altos responsáveis coreanos ignoravam que Toyotomi Hideyoshi estava mesmo a preparar uma expedição militar ambiciosa que assolaria os seus domínios. 
Em finais de Maio de 1592, os japoneses chegam surpreendentemente a Busan, tomando e saqueando a cidade. Entre 8500 a 30 000 coreanos pereceriam durante a ocorrência, embora a armada nipónica tenha sofrido igualmente algumas baixas. Praticamente em simultâneo, os japoneses tomariam a fortaleza de Dongnae, onde cinco mil coreanos perderiam a vida ao defenderem em vão aquela estrutura. Mesmo vendo a derrota como inevitável, o governador da praça Song Sang-hyeon preferiu morrer do que entregar de mão beijada a livre passagem dos japoneses que pretendiam chegar à China. Motivados pelo seu ascendente militar, os japoneses acabariam por tomar várias cidades, vilas e castelos da Província de Gyeongsang.
Os coreanos tentarão reagir, procurando encetar uma emboscada diante das colunas japonesas em Sangju, mas a mesma redundará num fiasco, culminando na morte de 700 coreanos que não conseguiriam escapar ao poder de fogo nipónico. Resultado idêntico ocorrerá posteriormente na batalha de Chungju, onde a cavalaria e os arqueiros coreanos serão trucidados novamente pelos japoneses. O general coreano Sin Rip suicidou-se num rio localizado perto do “epicentro” da batalha, de forma a não cair humilhantemente nas mãos inimigas. 
Em inícios de Junho de 1592, Seul (designada na altura de Hanseong) passará a ser o novo alvo dos japoneses que estavam assim a conseguir grandes avanços territoriais. A conquista da então capital do reino coreano foi quase um passeio para os nipónicos. De facto, o rei coreano Seonjo e o seu general Kim Myong-won puseram-se logo em fuga, logo que as suas forças haviam falhado nas acções de defesa ao largo do rio Han. Muitos habitantes abandonaram também as suas casas de forma a fugir à chegada implacável do invasor. Por conseguinte, os japoneses entrarão em Seul, deparando-se com uma cidade praticamente abandonada e com vários focos de incêndio, dado que muitos civis coreanos, antes de deixarem a capital, pegaram fogo às habitações e edifícios, levando ainda muitos bens materiais de valor. 
Após a tomada de Seul, os japoneses dirigem a sua campanha para as regiões nortenhas da Coreia. Pyongyang tornou-se no alvo preferencial. Ao contrário do que havia ocorrido em Seul, a batalha iria ser mais violenta, apesar de o rei Seonjo ter procurado novamente um refúgio seguro (em Uiji, já perto da fronteira com a aliada China), de forma a estar sempre protegido em qualquer um dos cenários possíveis. 
No castelo daquela cidade norte-coreana estavam 10 mil homens preparados para a defender. Os japoneses chegariam, muito em breve, com 30 mil homens. Os coreanos tentarão sortidas contra o acampamento nipónico de Sō Yoshitomo, provocando terríveis confrontos. Mas em breve, os japoneses conseguirão atravessar o rio que servia, como um dos obstáculos naturais à sua entrada naquela cidade, e começarão a forçar o abandono dos militares e civis coreanos. No dia 24 de Julho, os samurais nipónicos apoderam-se da cidade que já tinha sido praticamente abandonada. 
Ainda nesse mês, outros contingentes ou colunas japonesas tomaram os territórios de Jeongseon, Yeongwol, Chunchon e Pyeongchang, além de castelos situados na faixa oriental da Península Coreana, desde Anbyon até Samcheok. Os japoneses começam inclusivamente a impor os seus modelos de administração civil bem como o seu específico sistema de castas. Os nipónicos conseguirão fazer mesmo incursões já na Manchúria, entrando assim no território chinês, o qual era o seu primordial objectivo desde cedo. Aí as primeiras escaramuças serão inconsequentes.
Neste primeiro ciclo, o Japão levaria claramente a melhor nas batalhas navais, e sobretudo, nas incursões terrestres, onde são imparáveis em campo aberto. Os coreanos que já tinham perdido Seul ou Hangseong (a capital) e Pyongyang, não tinham outra hipótese senão recorrer a tácticas de guerrilha de modo a provocar algum desgaste no invasor, além de aguardarem a qualquer momento por uma ajuda militar proveniente da China.





Imagem nº 3 - O desembarque das forças nipónicas que culminaram com o saque e a tomada de Busan em Maio de 1592. Altos generais coreanos teriam negligenciado a sua abordagem em torno da aproximação dos navios japoneses, julgando inicialmente de que se trataria de uma frota que estava a cumprir uma missão de grande aparato comercial.





Imagem nº 4 - Os samurais japoneses evidenciavam-se nas batalhas em campo aberto e nos assédios aos castelos e povoações coreanas.
Créditos: David Benzal - Art Station




2º Ciclo: A Coreia volta a ter esperança: um almirante recusa render-se!

Os japoneses tinham acumulado um registo quase imaculado de triunfos contra os coreanos, mas havia um alto oficial militar que revelava ser, desde cedo, uma pedra no sapato. O almirante coreano Yi Sun Sin era exímio em emboscar navios japoneses que transportavam mantimentos e reforços. Os samurais nipónicos sentiam que a acção desta personalidade condicionava o abastecimento das suas tropas, numa altura em que já admitiam encetar um ataque sonante contra a China. 
Mas quem era este almirante que se atrevia a fazer incursões marítimas? 
Yi Sun Sin havia nascido em Seul no ano de 1545. O seu pai tinha sido expulso da corte, o que motivou a sua família a sair da capital coreana rumo a Asan, na província de Chungcheong do Sul. No ano de 1572, Yi Sun Sin não consegue passar no exame oficial que dava acesso ao exército porque durante a prova cairia do seu cavalo, mas quatro anos depois será bem-sucedido numa segunda tentativa de ingresso. Neste âmbito, começou por ser um soldado raso, mas em 1591, torna-se comandante do distrito naval de Jeolla-do, tendo sido recomendado para este posto por Yu Seong-ryong, uma personalidade influente que servia a dinastia Joseon. No ano seguinte, começavam as invasões japonesas, e Yi Sun Sin teve de assumir um papel relevante na defesa do seu país.
Em meados de Junho de 1592, o almirante coreano ataca uma frota japonesa que se achava ancorada na Baía de Okpo e que servia exclusivamente para fins de abastecimento das forças invasoras. Como a maior parte dessas embarcações continham tripulações desarmadas, os coreanos não tiveram grandes dificuldades em provocar a destruição de, pelo menos, 26 navios. Esta seria a primeira provocação do almirante coreano.
Em Julho, o almirante soma novas vitórias nas batalhas navais de Sacheon, Dangpo, Danghangpo e Yulpo, recorrendo já aos celebres navios-tartaruga, uma invenção militar que iria fazer, em breve, a diferença nesta terrível guerra. 
No entanto, o enfrentamento mais sonante ocorreria entre os dias 14 e 16 Agosto, sendo que, uma vez mais, o almirante coreano almejou cortar as linhas de abastecimento dos japoneses. Depois de avistar uma frota inimiga nos estreitos de Kyonnaeryang, Yi Sun Sin simulou uma retirada, atraindo os nipónicos para uma batalha em alto mar, mais concretamente, na baía de Hansando, onde se achavam várias ilhas desabitadas. Ao morderem o isco, os mais de 80 navios japoneses iriam deparar-se agora com a armada naval coreana disposta numa formação semi-circular. Os coreanos voltaram a usufruir dos célebres barcos-tartaruga que, devidamente apetrechados com canhões de alto calibre, bombardearam intensivamente os navios japoneses, evitando encetar inicialmente qualquer aproximação clara em relação ao inimigo, dado que este poderia ter alguma vantagem ao nível das manobras. Aliás, as acções de assalto às embarcações japonesas só seriam autorizadas por Yi Sun Sin numa fase mais avançada da batalha, ou seja, só depois de muitos navios inimigos se acharem destruídos ou em chamas.
Dentro deste contexto, os estragos provocados pelo poder de fogo e pelas flechas coreanas iriam colocar em debandada a frota oponente, e por conseguinte, os homens de Yi Sun Sin lançaram-se finalmente sobre os navios atingidos. Nesse momento bélico, se evidenciariam igualmente capitães coreanos como Yi Kinam e Chong Hun que, lançando-se sobre os barcos adversários, provocaram uma razia total e neutralizaram vários combatentes nipónicos. O general japonês Wakizaka Yasurahu conseguiu escapar por uma unha negra, enquanto muitos dos seus companheiros não tiveram a mesma sorte. Ao todo, os japoneses perderiam 47 navios e cerca de 9 mil homens na batalha de Hansando (ou Hansan), enquanto os coreanos não perderam nenhum dos seus barcos-tartaruga, tendo apenas sofrido 19 baixas nos posteriores combates corpo a corpo. 
Este grande êxito militar de Yi Sun Sin e dos seus barcos-tartaruga desafiaria, no imediato, o poderio naval japonês. No entanto, a guerra ainda estava longe do fim.





Imagem nº 5 - Os barcos-tartaruga coreanos alcançam uma grande vitória na Batalha de Hansando.





Imagem nº 6 - O Almirante Yi Sun Sin esteve por detrás do auge dos barcos-tartaruga.
Créditos: Genius




Os Barcos-Tartaruga

Yi Sun Sin decidiu avançar para a construção dos barcos-tartaruga, de forma a enfrentar as frotas japonesas em alto mar. De acordo com o Canal História, tratavam-se de navios que se achavam cobertos por uma espécie de carapaça blindada, embora coberta de feno e de espigões/espinhos (de ferro) afiados, ali camuflados, que impediam qualquer abordagem de assalto bem-sucedida por parte do inimigo. O seu revestimento com chapas de metal também tornava estes barcos mais resistentes diante dos ataques inimigos.
Os navios-tartaruga eram munidos de vários canhões de grande calibre colocados então nas laterais a bombordo e estibordo das embarcações coreanas. A embarcação tinha ainda na sua proa ou extremidade dianteira a "cabeça de um dragão" (esculpida) que servia para assustar os soldados japoneses, e houve casos, em que algumas delas foram usadas para libertar um fumo tóxico gerado a partir da mistura de enxofre e salitre, servindo para obstruir ou tapar a visão dos japoneses que costumavam ser exímios nas manobras. Também a cabeça de dragão poderia, nalguns casos, ocultar um canhão, assumindo assim um poder de fogo inesperado. 
Um barco-tartaruga poderia ter capacidade para albergar 36 canhões, além de assumir uma mobilidade bastante interessante, sendo que era impulsionado por 16 grandes remos que seriam manejados por cerca de 80 tripulantes. Estas embarcações detinham igualmente força suficiente para abalroar qualquer outro navio que ousasse desafiá-las, contudo o seu elevado poder de fogo beneficiava uma abordagem inicial mais estática ou posicional, mantendo sempre a sua organização prévia sobretudo diante de frotas inimigas que estivessem em superioridade numérica.





Imagem nº 7 - Exemplar de um Barco-Tartaruga exposto num museu em Seul.
Créditos: Ulana Holtz (Flickr)




3º Ciclo – A Reviravolta Coreana solidifica-se com o apoio da China

Após a batalha de Hansando, os coreanos irão capitalizar os seus feitos bélicos. Sempre recorrendo a milícias que operavam em terra, e beneficiando ainda da frota do almirante imparável, lograrão causar degaste no invasor. As forças coreanas poderiam ser bastante heterogéneas ao ponto de incluírem nas suas fileiras soldados sobreviventes, aristocratas, plebeus e até monges budistas. 
Gwak Jae-u foi um dos líderes milicianos coreanos que mais se evidenciou através de campanhas, protegendo a região em torno dos rios Nakdong e Nam e impedindo assim que os japoneses acedessem à província de Jeolla, sítio onde se achava a base de operações do almirante Yi Sun Sin.
Em breve, surgiria uma primeira tentativa por parte dos coreanos para recuperar Seul, mas ainda assim a superioridade numérica das forças japonesas travaria, para já, qualquer êxito dos grupos guerrilheiros. 
No entanto, o ano de 1592 ia passando. O Outono seria duro para os japoneses que começaram a cobrar pesados impostos em muitas das regiões submetidas, o que originou uma série de rebeliões. A mais grave de todas deu-se em Hwanghae, quando a população local se revoltou com o apoio de milicianos e soldados coreanos fugitivos. Dentro deste contexto, cerca de 500 soldados e 200 civis encabeçaram esta rebelião, chegando ao ponto de tomar o Castelo de Joenan. Outras fortalezas, dominadas por japoneses ou coreanos traidores, foram também alvo de assaltos inesperados de milicianos. 
Entretanto, o rei coreano Seonjo decidiu solicitar a intervenção militar da aliada China que era, na verdade, o alvo ambicioso que os japoneses pretendiam essencialmente atingir, aquando da idealização desta intervenção armada. O imperador chinês Wanli, da Dinastia Ming, começou por confiar missões a pequenos destacamentos, contudo os resultados inicialmente verificados não foram conclusivos ou suficientes para mudar o rumo dos acontecimentos na Coreia. 
Todavia, em Janeiro de 1593, o imperador Wanli enviará finalmente um exército poderoso que seria composto por 100 mil homens. Os generais Song Yingchang e Li Rusong foram encarregados de conduzir estas tropas. O grande alvo passaria a ser a principal cidade norte-coreana dominada pelos japoneses – Pyongyang. Cerca de 10 mil coreanos juntaram-se também a esta operação, de forma a reaver a urbe que havia caído nas mãos dos japoneses no Verão de 1592. 
A 6 de Fevereiro de 1593, inicia-se a batalha por Pyongyang. Numa colina situada a norte da cidade, alguns destacamentos japoneses são esmagados, e os seus generais só conseguem escapar com vida, muitos graças a alguns contra-ataques que outros contingentes nipónicos conseguem efectuar de forma a aliviar a pressão que havia caído sob as suas forças. No dia 8 de Fevereiro, chineses e coreanos, apoiados pelos bombardeamentos dos canhões e pelo lançamento de inúmeras flechas de fogo, avançam sobre as muralhas, utilizando altas escadas móveis. Os combates serão violentos, e a primeira abordagem ofensiva será bastante árdua e esgotante ao ponto de Li Rusong (comandante que encabeçava as forças chinesas) prometer uma recompensa choruda ao primeiro soldado do seu exército que conseguisse entrar dentro de Pyongyang. O assalto aos muros seria renovado com maior vigor, fazendo com que os japoneses começassem a recuar, além de que as defesas físicas da cidade ficariam num estado lastimável por causa do poder de destruição dos canhões oponentes. Por seu turno, os chineses tentam ainda atacar um forte que se situava no ponto norte de Pyongyang, contudo não conseguem prontamente tomá-lo devido à heróica resistência de japoneses que reprimiram o assalto com as suas armas de fogo. Os chineses entretanto decidiram parar a ofensiva. No entanto, Pyongyang estava devastada e os japoneses sabiam que já não se encontravam reunidas boas condições para assegurar a sua defesa, pelo que aproveitaram a noite e a paragem temporária das hostilidades para se retirarem discretamente da cidade, atravessando para esse efeito o congeladíssimo rio Daedong (ou Taedong; que fazia fronteira natural com a cidade e que não era vigiado pelos chineses presentes no exterior) e rumando em direcção a Hanseong (Seul). 
Chineses e coreanos recuperavam assim Pyongyang, e ainda no mês de Fevereiro, reconquistariam as províncias de Gaeseong, Gyeonngi e Gangweon. A 27 de Fevereiro, as forças aliadas tentam surpreender o invasor que estaria a reagrupar-se numa retirada organizada para Seul, ainda nas mãos dos japoneses. Dentro deste contexto, irá decorrer a Batalha de Byeokjegwan, então já muito perto daquela cidade. Os chineses tentam atacar os japoneses que estavam posicionados numa colina, e inicialmente são bem-sucedidos, fazendo com que os invasores acelerassem o seu processo de retirada. Contudo, os chineses dispersaram-se imediatamente, ignorando que os flancos japoneses se reorganizariam para contra-atacar. Beneficiando da qualidade superior das suas espadas e dos seus mosquetes, as forças nipónicas derrotaram mesmo os chineses, sendo uma das poucas vitórias que registaram nesta fase de evidente declínio. O próprio general chinês Li Rusong caiu do cavalo e, se não fossem os seus camaradas a acudi-lo, teria mesmo perdido a vida, destino que, contudo, viria a acontecer a, pelo menos, 2 mil homens seus neste confronto. 
Os japoneses não aproveitaram este triunfo para voltar a tomar a iniciativa, pelo que, em Março, os coreanos voltaram a carga, ocupando o castelo de Haengju que estaria praticamente abandonado. Esta fortaleza, presente a noroeste de Seul, ficava no cimo de uma colina que, na sua parte sul, era banhada pelo Rio Han, enquanto que nos outros três lados proliferavam as zonas pantanosas. Os coreanos, liderados pelo general Kwon Yul, seriam 10 mil ao todo, contudo só 2 300 é que ficaram no interior da fortificação. No imediato, aproveitaram para reparar os seus muros e construíram paliçadas, de forma a precaverem-se para uma eventual reacção japonesa. 
Em breve, um poderoso exército japonês composto por 30 mil homens aborda o castelo, procurando cercá-lo. Os nipónicos, então comandados por Konishi Yukinaga, passaram ao ataque. No entanto, os coreanos lançaram uma imensidão de flechas, rockets, pedras e ainda pó (neste último caso, para obstruir a visibilidade do inimigo) o que prejudicou as abordagens dos japoneses. Os combates corpo a corpo seriam igualmente intensos e violentos. Nas três tentativas de assalto, os japoneses fracassaram, embora tenham causado brechas nas muralhas e baixas na guarnição coreana. As forças de Konishi Yukinaga abandonaram o cerco logo que se espalharam rumores da eventual chegada de um exército de auxílio que viria em socorro dos coreanos então entrincheirados no castelo de Haengju. Os japoneses terão perdido mais de 10 mil homens, durante o assédio, enquanto os coreanos terão visto tombar algumas centenas dos seus. 
A vitória em Haengju (14 de Março de 1593) voltou a dar um grande alento às forças coreanas e chinesas que começaram a ambicionar a reconquista de Seul, algo que ocorrerá logo em Maio, sem que haja sequer um grande combate. Os japoneses, que tinham assistido, nos últimos tempos, à redução das suas forças operacionais de 150 mil para pouco mais de 50 mil efectivos, decidiram evacuar Seul e reposicionar-se noutras posições a sul da Coreia. Antes de abandonarem a cidade, os japoneses pegaram fogo a vários edifícios relevantes.
No Verão de 1593, e após sucessivos dissabores belicistas, os japoneses procuram finalmente reagir e apontam as suas miras para o projecto de conquista da estratégica fortaleza de Jinju, sita no sul da Coreia, após terem fracassado já em algumas tentativas anteriores dirigidas contra esta imponente estrutura. A 21 de Julho, os japoneses iniciam o assédio, assolando as posições dos coreanos ao longo do rio Chinyang, enquanto uma alta torre de cerco, tripulada por arcabuzes, desgastava as guarnições da fortaleza. Os assaltos são cruéis e implacáveis. Os japoneses recorrem ao poder dos seus canhões, e através de grandes escadas, tentam subir os muros. Por seu turno, a guarnição coreana recorre a pedras, troncos e a água em fervura para evitar que os assaltantes escalem com sucesso.
Ao constatar a forte resistência coreana, um dos generais japoneses, Kato Kiyomasa, ordenou a construção de alguns vagões pesados de madeira, devidamente cobertos com peles ou couro à prova de fogo e com telhados capazes de suportar o peso das pedras arremessadas pelo adversário.
Após alguns dias de sucessivos bombardeamentos (já para não falar de uma tempestade que se abateu sobre a região), uma secção das muralhas cairia e os japoneses conseguiram entrar na fortaleza, a 29 de Julho, dizimando qualquer tipo de resistência. Ao todo, cerca de 60 mil coreanos (entre soldados, milicianos, voluntários e civis) perderam as suas vidas nos combates. Esta vitória permitiu levantar a moral dos líderes japoneses que conseguiram assim manter, nos próximos tempos, alguns dos bastiões e castelos que detinham no sul da Coreia. 
Entre 1593 e 1597, o conflito conhecerá um abrandamento das hostilidades, sem que ocorram grandes sobressaltos. 
Durante quase quatro anos de estagnação do conflito, as autoridades coreanas construíram novos castelos e melhoraram os aspectos defensivos daqueles que já existiam. O rei Seonjo criou mesmo uma “Agência de Formação Militar” procurando organizar e treinar as suas tropas que passavam assumir disposições que poderiam assentar em unidades ou em companhias. Surgiram igualmente esquadrões de arqueiros, arcabuzes e guerreiros com armas de filo cortante. Foi também determinado que os escravos poderiam ser recrutados para o serviço militar, de forma a engrossar as tropas coreanas. Ainda assim, a corrupção interna continuava a manchar a solidez coreana neste período crítico.
Por sua vez, a China e o Japão chegaram a encetar algumas negociações diplomáticas entre 1594 e 1596, abordando a indefinição que grassava na Coreia. O Japão queria que a China reconhecesse o seu domínio no sul da Coreia, estando disposto a aceitar que a zona norte da Península poderia ser uma espécie de regime satélite da China. Contudo, os chineses nunca abdicaram da sua exigência que visava a retirada total dos japoneses do território coreano. Os esforços de paz iram esfumar-se e a guerra iria ser pois reatada em 1597 com uma nova invasão nipónica. 





Imagem nº 8 - Chineses e coreanos reconquistam Pyongyang nos inícios de Fevereiro de 1593.
Créditos: Wikipédia




Imagem nº 9 - Os Japoneses tentam atacar as posições coreanas numa paliçada junto da Fortaleza de Haengju. O fiasco da sua tentativa em tomar esse castelo estratégico culminará, nos próximos tempos, com o abandono de Seul que será assim recuperado pelos coreanos e seus aliados chineses.




4º Ciclo – A Segunda Invasão: japoneses voltam a somar vitórias

O regente imperial japonês Toyotomi Hideyoshi iria ordenar uma segunda invasão, desta feita, com o intuito exclusivo de tomar a Coreia, descartando para já um ataque à China. 
Em 1597, o líder japonês enviou 200 barcos, engrossando as forças que até então se achavam estacionadas em alguns bastiões e castelos da zona sul-coreana. Ao todo, os nipónicos passariam a contabilizar um total de 141 mil homens.
Os chineses foram novamente em socorro dos seus aliados coreanos. Yang Hao comandaria agora um exército terrestre de 55 mil homens que colaboraria com as forças coreanas no sentido de inviabilizar novos êxitos japoneses. Os chineses enviaram ainda uma força naval composta por mais de 20 mil soldados. 
Nos primeiros tempos, a ofensiva nipónica alcança resultados reduzidos. No entanto, os japoneses chegaram a tomar cidades ou povoações como Sacheon, Changpyong, Namwon e Jeoju, demonstrando que poderiam acelerar esta senda a qualquer momento, caso o cenário se tornasse mais propício.
Por seu turno, o almirante coreano Yi Sun Sin prosseguia com as investidas dos seus barcos-tartaruga, dificultando uma vez mais as operações dos navios japoneses que tencionavam introduzir mais homens e bens de abastecimento (militar) na Coreia. Também a China, como já mencionámos, prestou auxílio na defesa da costa da Península Coreana.
No entanto, em breve, rebentaria mais uma saga de intrigas na corte coreana. Nem o almirante Yi Sun Sin escaparia às tramóias internas. Este responsável militar seria mesmo degredado, por algum tempo, acusado de se ter recusado a não atacar a frota do general japonês Kato Kiyomasa que carregava um número considerável de tropas que então rumaram ao território coreano. A história é mais complexa e dúbia do que se julga. A informação que chegara às mãos de Yi Sun Sin tinha sido entregue por um agente secreto que possivelmente não mereceria a sua total confiança. Além disso, a zona costeira onde se poderia descortinar a referida frota japonesa não era a mais recomendável para uma emboscada, dado que existiam pedras gigantescas no fundo das águas. Todavia, o rei coreano Seonjo não seria sensível a estes argumentos, colocando de parte o herói dos barcos-tartaruga e nomeando para o seu lugar o almirante Won Gyun, o qual acusava Yi Sun Sin de ser preguiçoso e de procedimentos pouco aceitáveis. 
No entanto, o soberano iria arrepender-se em breve desta decisão.
Em primeiro lugar, os japoneses começaram a sentir mais facilidades no transporte de mantimentos, armas e soldados, e assumiram um evidente domínio dos mares. Mas o pior ainda estava por vir, como veremos daqui a pouco! 
Contando agora com novos vultos militares na liderança, os coreanos irão ter o primeiro grande teste de fogo – a batalha naval de Chilchonryang (ou Chilcheollyang) que se travará a 28 de Agosto de 1597. Dentro deste contexto, a força naval coreana, liderada então por Won Gyun, deixa a região de Hansando para abordar o invasor numa zona de mar aberto, já perto de Busan. O ataque correrá mal: os coreanos perdem 30 barcos, e o seu almirante procura recuar de forma segura para a Ilha de Gadeok. Todavia, e como se não bastasse, esta ilha detinha uma fortificação que já estava controlada pelos… japoneses. A guarnição saiu em defesa das suas posições surpreendendo os coreanos que haviam ali ancorado. Cerca de 400 destes morreram imediatamente nos combates, enquanto os restantes procuraram retomar a via da navegação, tentando agora achar um refúgio temporário nos estreitos de Chilchonryang. No entanto, os japoneses lançam um ataque ambicioso pela noite, causando um impacto devastador nos coreanos que já se encontravam desmoralizados devido aos infortúnios anteriores. Estes últimos não se conseguiram reorganizar e entraram logo em pânico, não fazendo sequer grande benefício dos seus canhões. Em breve, uma imensidão de destroços pertencentes a 150 navios coreanos, então arrasados, flutuariam pelos estreitos. Aqueles que conseguiram chegar a terra, foram naturalmente mortos pelas forças da fortaleza de Gadeok. O almirante Won Gyun foi alegadamente um dos que morrera a lutar em pleno areal, embora tentasse forçar, nesse momento em concreto, a sua escapatória. Outro grande comandante coreano, Yi Eok-gi, combateu também até à exaustão, acabando por cair nas águas e morrer afogado. Foram pouquíssimos os destacamentos coreanos que conseguiram escapar ao massacre. Das cerca de 200 embarcações que dispunham, os coreanos perderam 188 neste conflito naval!
A Coreia estava agora em grande perigo. Muitos dos seus barcos-tartarugas, que também haviam sido usados nesta batalha, foram destruídos. A sua frota estava completamente aniquilada. Acreditava-se que só os chineses poderiam agora atenuar as consequências do poderio japonês, dado que ainda dispunham de uma força naval. 
Durante dois meses, tudo parecia perdido… mas surpreendentemente, aconteceria o cenário mais improvável, contrariando todos os que esperavam uma derrocada coreana inevitável.  





Imagem nº 10 - Os japoneses trucidam a frota coreana no Estreito de Chilchonryang, em finais de Agosto de 1597. O almirante coreano Won Gyun não sobreviverá ao enfrentamento.




5º Ciclo – O milagre do almirante Yi Sun Sin, o "mártir" da independência coreana

Após a humilhação de Chilchonryang (ou Chilcheollyang), o rei coreano Seonjo foi pressionado a voltar atrás, não tendo outra hipótese senão confiar novamente no almirante Yi Sun Sin que, ao ser reabilitado pelo regime, sucederia no comando ao falecido Won Gyun. Aliás, esta era uma jogada de desespero por parte do soberano oriental.
Yi Sun Sin receberia uma herança pesada – uma frota arruinada com poucos barcos disponíveis, bem como tripulações absolutamente desmotivadas.
Os japoneses tinham aproveitado o importante triunfo anterior para reforçar a pressão sobre a costa coreana, tentando neutralizar qualquer foco de resistência. 
Por seu turno, Yi Sun Sin decidiu estabelecer-se no sudoeste da Coreia, montando a sua base nos estreitos de Myongnyang (ou Myeongnyang) e estudando as marés incomuns desta região, de forma a poder usá-las para surpreender os japoneses que, em breve, ali chegariam para suprimir qualquer embarcação que lhes fizesse frente. Efectivamente, as marés daquele lugar corriam muito depressa e assumiriam diversas direcções, embora se evidenciasse mais as tendências de norte para oeste. As águas poderiam correr a uma velocidade que atingiria entre 9,5 até 11,5 milhas. Yi Sun Sin sabia que precisava de estudar as condições naturais atípicas daquela região marítima para derrotar o poderoso inimigo. Os coreanos só dispunham de 12 navios-tartaruga que haviam escapado ilesos da malograda batalha de Chilchonryang, enquanto os japoneses viriam a apresentar uma frota com 133 navios. Em jeito de primeira análise, o almirante coreano sabia que precisava de um milagre. As condições naturais até poderiam jogar a seu favor, mas a desproporção das forças em combate seria sempre muito grande. 
Ao chegarem ao estreito de Myongnyang no dia 26 de Outubro de 1597, os japoneses aproveitam o vento favorável, embora desconhecendo as marés agitadas do lugar, para finalmente se aproximarem da frota de Yi Sun Sin. Este último assumiu um posicionamento em mar aberto, a norte do estreito, e quando teve conhecimento de que os japoneses tinham avançado até meio do referido estreito, decidiu atacar. Com recurso ao alto calibre dos seus canhões e flechas de fogo, causaria naturalmente estragos no inimigo. Nesta fase, Yi Sun Sin não se procurou aproximar demasiado do inimigo porque sabia da sua desvantagem numérica, preferindo manter a organização táctica e a coesão dos seus barcos. O vento e as correntes mudariam inesperadamente (ou talvez o almirante coreano já previsse que tal deveria acontecer), o que fez com que os barcos japoneses começassem a colidir entre si, além de outros serem empurrados para os confins do estreito. A estupefacção apoderou-se das hostes nipónicas que perderam também, desta feita, a sua capacidade de reacção. Muitas procederam à retirada desorganizada. Ao todo, os japoneses perderam 31 navios, e entre 8 a 12 mil baixas efectivas em termos de soldados. Por seu turno, os coreanos não lamentaram a perda de qualquer barco-tartaruga, sofrendo apenas 2 baixas. Estes números que surgem nas crónicas oficiais podem ser demasiado desproporcionais (ou até pouco realistas), mas não há dúvidas de que Yi Sun Sin alcançaria uma vitória impensável e sem sofrer grandes estragos materiais e humanos diante de um adversário poderoso. 
A batalha de Myongnyang (ou Myeongnyang) foi uma humilhação histórica para os japoneses que, apesar de não abandonarem já definitivamente a Coreia, jamais voltariam a assumir a hegemonia naval durante o conflito. 
Quase um ano depois, o regente imperial japonês Toyotomi Hideyoshi falecerá (18 de Setembro de 1598), e com ele parecem ter caído os projectos expansionistas. Não se sabe se o mesmo, no leito da sua morte, terá mesmo dado a ordem de abandonar a Coreia. Certo é que a corte nipónica começará mesmo a planear a retirada, evacuando fortalezas e castelos até então controlados na Coreia. Os chineses e os coreanos vão tentar ao máximo dificultar esse processo, procurando arrasar as forças japonesas que procuravam regressar ao seu país.
Em breve, chineses e coreanos lançam três ataques massivos contra os territórios de Ulsan, Sacheon e Suncheon que estariam sob administração japonesa. O epicentro do conflito decorrerá mesmo em Sacheon, travando-se uma dura batalha pelo controlo do seu castelo em Outubro de 1598. As forças aliadas eram lideradas pelo general chinês Ton Yuan, e contavam com a participação de 34 mil soldados chineses e 2 mil combatentes coreanos. No entanto, estas não chegariam a tempo de evitar uma manobra temporária de reforço da guarnição japonesa que engrossou as suas fileiras de forma a enfrentar esta ameaça. Os combates serão bastante confusos com ambas as partes a cometerem erros ofensivos e defensivos. 
Os chineses trazem para a batalha um aríete e um canhão de forma a derrubar o portão principal, mas os japoneses conseguirão neutralizar estes equipamentos, lançando ainda através de catapultas várias bombas de fogo que assolaram posições ocupadas pela armada chinesa. Como se não bastasse, o armazém improvisado de pólvora seria atingido, fazendo rebentar grandes explosões no acampamento chino-coreano. No dia 30 de Outubro, os japoneses, comandados por Shimazu Yoshihiro, decidem mesmo sair do seu castelo mediante a disposição de três formações que saíram respectivamente dos seus três portões de forma a atacarem as posições adversárias. Os chineses não aguentaram o embate e colocaram-se em fuga, após terem sofrido mais de 30 mil baixas.
Este triunfo nipónico foi inesperado, mas não faria mudar os planos superiores de retirada. No entanto, era um aviso claro de que as forças ainda remanescentes não hesitariam em pegar em armas em vez de se renderem, enquanto não tivessem oportunidade de abandonar a Península Coreana.
Durante os meses finais de 1598, os japoneses intensificaram o processo de retirada. É certo que houve escaramuças e pequenas batalhas pelo meio que conheceram os mais diversos resultados. 
A 17 de Dezembro de 1598, e já quando a evacuação japonesa se encontrava muito perto de se completar, o almirante Yi Sun Sin procurou surpreender, durante a noite, uma frota japonesa ancorada no Estreito de Noryang. E o seu sucesso é imediato. Metade das embarcações é destruída ou fica em chamas. Os japoneses procuram reorganizar-se e tentam atacar o navio do almirante aliado chinês Chen Lin. O então almirante coreano Yi Sun Sin foi em seu socorro, empunhando mesmo um arco. No entanto, as tropas nipónicas apercebem-se de que não têm condições para se manterem nos combates e tentam acelerar a sua fuga. O almirante coreano Yi Sun Sin ordenou uma perseguição ousada de forma a garantir a vitória. Os japoneses iriam perder 450 dos seus 500 navios, lamentando milhares de baixas. No entanto, a vitória coreana ficaria manchada pela perda do seu herói – o almirante coreano Yi Sun Sin não resistiria a uma bala disparada por um atirador japonês que o atingiu na axila esquerda (outros referem que foi no peito). O alto responsável coreano pediu, nos seus derradeiros fôlegos, para que ocultassem a notícia da sua morte de forma a não ser comprometido o triunfo na batalha. O seu corpo seria coberto por um escudo, e os três oficiais associados que tiveram conhecimento da situação remeteram-se ao silêncio, só divulgando o "martírio" de Yi Sun Sin após o final das escaramuças. Durante a batalha, e além do falecimento do seu líder militar, os coreanos perderam cerca de 500 homens.
Não obstante, não há dúvidas de que o almirante Yi Sun Sin, nem sempre bem compreendido pelo frágil monarca coreano Seonjo, salvou o seu país da ameaça japonesa, devolvendo o orgulho ao seu povo, mesmo quando tudo parecia jogar contra a sua causa. Ajudou a vencer uma guerra turbulenta, e morreu a combater nos últimos suspiros desta. 
As Guerras Imjin (Invasões da Coreia pelo Japão) decorreram entre os anos de 1592 e 1598, tendo provocado, pelo menos, um milhão de mortes, entre civis e soldados. 
Em 1601, Coreia e Japão iniciavam finalmente conversações de paz. Nos anos seguintes, muitas trocas de prisioneiros iriam ter lugar, e as relações políticas e comerciais acabariam por ser normalizadas. Para trás, ficou um rastro de sangue, destruição e vários episódios horrendos com atrocidades a serem cometidas por ambos os lados. 



Local: Estreito de Myongnyang (Myeongnyang)
Data: 26 de Outubro de 1597
Forças Beligerantes


      Coreia


Japão
Comandantes, Generais, Protagonistas
Almirante Yi Sun Sin

Tōdō Takatora
Katō Yoshiaki
Kurushima Michifusa †  

Número de Combatentes/Navios
12 navios
Exército poderoso (não contabilizado)
130 navios
Exército poderoso (não contabilizado)
Baixas Estimadas:
0 navios
Entre 2 a 10 soldados
30 navios
(8 a 12 mil soldados)
Resultado: Apesar da clara inferioridade numérica, o almirante coreano Yi Sun Sin conseguiu tirar proveito da coesão dos seus barcos-tartaruga e do alto calibre do seu poder de fogo (canhões) para provocar a debandada da expedição nipónica. As correntes e as marés do Estreito de Myongnyang também contribuíram, de forma determinante, para a desorganização e retirada em pânico da frota japonesa.

Tabela nº 1 - Dados da Batalha de Myongnyang (1597)





Imagem nº 11 - Os japoneses são surpreendidos no Estreito de Myongnyang nos dias derradeiros de Outubro de 1597. Os inúmeros barcos japoneses começam a colidir entre si devido às marés agitadas do lugar e não resistem ao poder de fogo dos canhões dos navios-tartaruga coreanos dispostos em formação. 
Créditos: Alchetron 





Imagem nº 12 - O Almirante Yi Sun Sin (1545-1598) é atingido fatalmente pelo disparo de um arcabuz japonês, quando os coreanos tinham praticamente carimbado o triunfo na batalha naval de Noryang. Ele que havia ajudado a ganhar esta guerra, embora nunca tenha saboreado a sua glória.




Referências Bibliográficas:

  • MACEDO, Emiliano - A Montanha e o Urso: Uma História da Coreia. Columbia/San Bernardino: Amazon Independent Publishing, 2011.
  • PEREZ, Louis (Ed.) - Japan at War: An Encyclopedia. Santa Bárbara/Califórnia: ABC Clio, 2013.
  • TURNBULL, Stephen - Busan (1592), Hansando (1592), Byeokjegwan (1593), Haengju (1593), Jinju (1593), Chilchonryang (1597), Myongnyang (1597), Sacheon (1598), Noryang (1598) in 1001 Battles That Changed The Course of History. Ed. R. G. Grant. Londres: Quintessence Editions, 2011.
  • https://www.infopedia.pt/$coreia, Porto Editora, 2003-2019. (Consultado em: 17/11/2019).
  • Documentário do Canal História sobre os grandes feitos ao nível da Maquinaria Belicista, o qual foi projectado no passado mês de Agosto.
  • http://www.samuelhawley.com/imjinarticle1a.html, (Artigo da autoria do esscritor Samuel Hawley que publicou uma obra sobre "The Imjin War - Japan's Sixteenth-Century Invasion of Korea and Attempt to Conquer China", consultado em: 17/11/2019).
  • Wikipédia (artigo em versão espanhola sobre as Guerras Imjin que surge com muita bibliografia reunida, dando alguma credibilidade ao artigo, consultado em: 17/11/2019).
  • https://www.koreapost.com.br/conheca-a-coreia/historia/dinastia-joseon-e-cultura-ocidental/, (Consultado em: 17/11/2019).
  • https://www.thoughtco.com/the-imjin-war-1592-98-4016849, (Consultado em: 17/11/2019).

sábado, 26 de outubro de 2019

Egas Moniz, o cientista do cérebro

António Caetano de Abreu Freire, mais conhecido por Egas Moniz, nasceu em Avanca a 29 de Novembro de 1874. Era filho de Fernando Pina Resende Abreu Freire e de Maria do Rosário de Almeida de Sousa Abreu.
Os seus estudos seriam frequentados na Primária de Pardilhó, no Colégio de São Fiel dos Jesuítas (Castelo Branco) e depois no liceu de Viseu. Em 1894, conseguiu matricular-se na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, onde irá alcançar a licenciatura em 1900 e doutorar-se no ano de 1901. A partir de 1902, entra mesmo no quadro docente daquela universidade. Torna-se ali professor catedrático em 1910.
Egas Moniz sempre demonstrou um interesse especial pela área da Neurologia que estuda o sistema nervoso do corpo humano. Foi assim em Coimbra, e depois, em França, onde trabalhou com grandes neurologistas de Bordéus e Paris.
Em 1911, o conceituado cientista será transferido para a Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa de modo a ocupar a cadeira de Neurologia que havia sido criada, de forma inédita, pela Primeira República. Chegou ainda a criar um consultório. Nesta nova fase da sua carreira, realizará investigações nas áreas da Angiografia Cerebral e da Leucotomia Pré-Frontal. Em breve, entrará na Academia de Ciências de Lisboa e se tornará ainda sócio de grandes academias estrangeiras. 
Sabemos também que Egas Moniz se dedicou à vida política, sobretudo na transição dos fôlegos derradeiros da Monarquia Constitucional para o dealbar da Primeira República. Dentro deste contexto, foi deputado de várias legislaturas entre 1903 e 1917, Ministro de Portugal em Madrid em 1917, Ministro dos Negócios Estrangeiros entre 1917-1918 e foi igualmente o primeiro Presidente da Delegação Portuguesa à Conferência da Paz em 1918, onde conseguiu reatar as relações entre a Santa Sé e Portugal, que haviam sido interrompidas em consequência da Lei da Separação. Em 1917, fundou o Partido Centrista Republicano, uma espécie de coligação dos partidos de direita, para fazer face ao governo do Partido Democrático. Resultante de uma dissidência do Partido Evolucionista, este novo partido apregoava uma aliança entre o capital e o trabalho, embora defendendo a introdução de medidas que dignificassem as classes trabalhadoras.
Apesar de ter sido um apoiante da efémera ditadura de Sidónio Pais (num contexto em que se tentava colocar fim à anarquia, à insurreição e à instabilidade da Primeira República), Egas Moniz sempre se revelou, ao longo daqueles anos, um democrata convicto e uma personalidade íntegra, e por isso, a sua vida política terminaria quando a ditadura militar de 1926, e depois, o Estado Novo se instalaram em Portugal.
Egas Moniz voltará ao seu labor de cientista, procurando combater o marasmo que existia nesta área. E aí continuará a deixar grande obra. Foi nomeado director do Hospital Escolar de Lisboa em 1922.
Em 1927, a Angiografia Cerebral, técnica inventada pelo cientista português e que passaria a ser utilizada para a detecção de anomalias nas artérias do cérebro, torna-se numa aposta ganha. Os Neurologistas passarão a usufruir de uma ferramenta importante para a investigação clínica em torno das neoplasias, hemorragias, aneurismas e outras mal-formações no cérebro humano. Assim abriram-se novos caminhos para o diagnóstico de tumores, aneurismas, malformações artério-venosas e traumas do crânio bem como para os futuros procedimentos de cirurgia cerebral. 
Por outro lado, Egas Moniz irá demonstrar interesse em abordar os distúrbios mentais humanos e, em 1935, assumiria a descoberta da técnica da Leucotomia Pré-Frontal (também muitas vezes associada à Lobotomia), que consistia em cortar a substância branca dos hemisférios cerebrais, para fazer o tratamento de certas doenças mentais tais como como esquizofrenia, psicoses, etc. Para a realização desta operação ele próprio criou o "Leucótomo". Apesar da técnica da leucotomia/lobotomia se achar hoje desacreditada devido aos seus efeitos secundários severos, a verdade é que, na primeira metade do século XX, foi uma novidade, dado que a retirada de um pequeno pedaço do cérebro permitia que os pacientes, com graves desequilíbrios mentais, pudessem tornar-se mais dóceis, passivos e fáceis de controlar. No entanto, também havia o risco de estes sofrerem convulsões após a operação, ou até ficarem em estado vegetativo. No entanto, na altura, a leucotomia pré-frontal constituiu um progresso importante dado que os médicos não conheciam ainda outras formas de tratar os doentes com debilidades mentais.
Em 1939, quando já contava com 64 anos, sofreu um atentado no seu consultório, por parte de um doente seu que, em estado paranóico, o tentou alvejar com oito tiros, dos quais cinco o atingiram. Quase por milagre, sobreviveu ao episódio e jubilou-se em 1944.
Egas Moniz receberia dois grandes prémios que atestariam o seu importante legado. Em 1945, recebe o Prémio de Oslo (pelos seus trabalhos sobre Angiografia Cerebral), e em 1949, receberá o Prémio Nobel da Medicina (muito devido à descoberta da Leucotomia Pré-frontal no tratamento de certas doenças mentais). Era o reconhecimento de uma notável carreira ao serviço da ciência.
Egas Moniz também foi coleccionador de artes, e deixou inclusivamente uma casa-museu em Avanca que hoje poderá ser visitada por qualquer um.
Além de alguma contribuição hospitalar, o médico/cientista foi ainda procurado por notáveis figuras do seu tempo tais como os poetas Fernando Pessoa e Mário de Sá Carneiro que desejavam ouvir os seus conselhos ou trocar impressões eruditas. O nosso biografado deixou igualmente várias publicações inovadoras.
Egas Moniz viria a falecer, com 81 anos de idade, em Lisboa, a 13 de Dezembro de 1955.



Obras da sua autoria:

  • Alterações anátomo-patológicas na difteria, 1900 (Tese de Licenciatura).
  • A Vida Sexual - Fisiologia, 1901 (Tese de Doutoramento).
  • A Neurologia na Guerra,  1917.
  • Clínica Neurológica, 1925.
  • O Padre Faria na História do Hipnotismo, 1925.
  • Diagnostic des Tumeurs Cérébrales et Épreuve de l'Encéphalographie Arthérielle, 1931.
  • L'Angiographie Cérébrale. Sea Applications et Résultats en Anatomie, Physiologie et Clinique, 1934.
  • Tentatives Opératoires dans le Traitement de Certaines Psychoses, 1936.
  • La Leucotomie Préfrontal. Traitement Chirurgical de Certaines Psychoses, 1937.
  • Clínica delle Angiografia Cerebrale, 1938.
  • Die Cerebrale Arteriographie und Phlebographie, 1940.
  • Trombosis Y Otras Obstrucciones de las Carotidas, 1941.
  • Última Lição - Bibliografia, 1944.





Retrato de Egas Moniz, cientista português (1874-1955).
Quadro da autoria de Henrique Medina



Notas-Extra:

1 - António Caetano de Abreu Freire de Resende ficou conhecido como o apelido de Egas Moniz porque o seu tio, o padre Caetano de Pina Resende acreditava que a família Resende descendia, de linha directa, de Egas Moniz, célebre aio de D. Afonso Henriques. 

2 -  António Egas Moniz casou-se a 7 de Fevereiro de 1901 com a brasileira Elvira de Macedo Dias, mas o casal nunca teve filhos. 

3 - Em Lisboa, existe hoje o Hospital Egas Moniz, um dos mais importantes de Portugal.

4 - Além de Egas Moniz, só houve mais uma personalidade portuguesa a ganhar um Prémio Nobel. Trata-se de José Saramago, escritor, que venceu o prémio máximo da Literatura em 1998.



Referências Consultadas:

domingo, 13 de outubro de 2019

A História em torno do Dia Internacional do Trabalhador


Dia 1 de Maio, Dia Internacional do Trabalhador

A história do Dia 1 de Maio remonta ao ano de 1886, quando 500 mil trabalhadores se revoltaram em Chicago, nos Estados Unidos da América, contra a exploração laboral e a inexistência de direitos.
Na altura, os operários norte-americanos chegavam a trabalhar até 17 horas por dia, pelo que exigiam uma redução da carga de trabalho para 8 horas. A greve prolongou-se nos dias seguintes, causando a paralisação económica naquele estado.
No dia 4 de Maio, uma bomba rebenta no Haymarket Square, causando a morte de 7 polícias e de 4 civis, além de centenas de feridos. A polícia retaliou a partir desse momento com maior agressividade.
Apesar de não haver provas quanto às origens da explosão, e num processo judicial minado por estereótipos (e sem grandes provas processuais), 5 sindicalistas anarquistas foram condenados à morte (4 foram enforcados em 11 de Novembro de 1887, 1 suicidou-se na cadeia antes da execução da pena) e 3 ficariam detidos (2 com penas perpétuas). Todos os cinco condenados à morte frisaram em Tribunal, logo após conhecerem a sentença, que estavam dispostos a morrer em nome da liberdade e de uma causa justa.
Durante os protestos destes dias iniciais de Maio de 1886, morreriam dezenas de trabalhadores (não há um número concreto tendo em conta as diversas ocorrências registadas em Chicago) devido aos confrontos com a polícia.
No ano de 1893, o governador de Illinois ordenaria a revogação da sentença, embora tal não fosse suficiente para recuperar as cinco vidas que já tinham sido sentenciadas ao desaparecimento. 
Em França, no dia 1 de Maio de 1891, uma manifestação similar foi dispersada pela polícia, resultando na morte de dez manifestantes.
Actualmente, o Dia do Trabalhador nos EUA celebra-se na primeira segunda feira de Setembro, e não no dia 1 de Maio (ainda não reconhecido verdadeiramente naquele país) como acontece em várias nações.
O Dia Internacional do Trabalhador em Portugal (então verificado a 1 de Maio) começou a ser celebrado a partir da Revolução dos Cravos a 25 de Abril de 1974.




Imagem nº 1 - As manifestações pelos direitos laborais em Chicago alcançaram uma grande amplitude em 1886.



Nota-Extra I: No ano de 1890 (isto é, quatro anos após as manifestações de Chicago), os trabalhadores norte-americanos conseguiriam a redução da carga de trabalho para 8 horas diárias.

Nota-Extra II: Artigo publicado originalmente no dia 1 de Maio de 2019.

Curiosidades Históricas XXII-XXVIII


Curiosidades Históricas XXII - São Gonçalo de Amarante

Natural de Arriconha, aldeia do concelho de Vizela, São Gonçalo nasceria por volta de 1187 e faleceria em Amarante, algures entre os anos de 1259 e 1262. Assim sendo, teria vivido entre 70 a 75 anos.
Conhecido popularmente como São Gonçalo de Amarante, sabemos que esta personalidade viria a desempenhar uma notável missão espiritual.
Gonçalo começou por servir na Igreja de São Paio de Riba-Vizela e, desde cedo, desejou estudar para se tornar num sacerdote. Por isso, viria a frequentar as disciplinas eclesiásticas na escola-catedral da Sé Arquiepiscopal de Braga. Em breve, seria nomeado sacerdote ou pároco da freguesia de São Paio de Riba-Vizela (hoje São Paio de Vizela).
Mas São Gonçalo não queria ficar apenas confinado à sua região, pelo que sonhava visitar um dia os túmulos dos apóstolos de São Pedro e São Paulo bem como os Lugares Santos da Palestina. Dentro deste contexto, ele irá confiar por tempo considerável a sua própria paróquia a um sobrinho que mais tarde o irá trair. Os próximos 14 anos serão marcadas por muitas aventuras que parecem não ter sido relatadas pelas crónicas medievais. Gonçalo peregrinou primeiro, por Roma, e terá depois estado em Jerusalém. É quase certo que terá visitado muitos lugares sagrados, contudo desconhece-se que papel desempenhara naqueles palcos durante as suas estadias alargadas.
Quando regressou a Portugal, e mais concretamente à paróquia de São Paio de Riba-Vizela, foi escorraçado pelo seu sobrinho que não o reconheceu como legítimo sacerdote daquela terra, tendo ainda forjado documentos falsos para manter o seu posto a todo o custo.
Resignado, Gonçalo de Amarante passará então a viver como um eremita, pregando o Evangelho pelas povoações junto ao rio Tâmega, tendo conseguido converter várias pessoas. Na zona de Amarante, criará mesmo uma pequena ermida e promoveu a construção de uma ponte em granito sobre o Tâmega.
Pouco tempo depois, abraçará definitivamente a vida dominicana, ingressando no Convento de S. Domingos de Guimarães, cujo prior seria o notável pregador castelhano dominicano Pedro Gonçalves Telmo. A evangelização prosseguiria naquela região muito por iniciativa destes dois vultos que desejaram inculcar valores morais nas comunidades, de modo a que a estas aderissem às vivências cristãs autênticas.
Pouco mais se soube sobre a sua vida.
Muito tempo após a sua morte, Gonçalo receberia o estatuto de beato em 1561 por determinação do Papa Pio IV. São Gonçalo de Amarante é visto hoje como protector dos humildes e dos enfermos, além de ser casamenteiro das mulheres idosas.




Gravura dos séculos XVII-XVIII que retrata São Gonçalo de Amarante em peregrinação.
(Digitalizada pelo grupo "Cabral Moncada Leilões")


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Curiosidades Históricas XXIII - O Tratado de Alcanizes

O Tratado de Alcanizes foi assinado em 12 de Setembro de 1297 entre o rei D. Dinis de Portugal e o rei Fernando IV de Leão e Castela. O acordo foi rubricado no povoado castelhano de Alcanizes.
Este tratado definiu as fronteiras dos dois países, sendo que Portugal conservaria praticamente tais demarcações territoriais até aos dias de hoje, tornando-se a nossa fronteira na mais antiga da Europa.
De acordo com o teor do tratado, era salvaguardada a paz entre os dois reinos nos finais do século XIII.
Portugal prescindirá definitivamente das suas reivindicações em torno de Aroche, Aracena, Aiamonte bem como das fortalezas de Valência de Alcântara, Ferreira e Esparregal que agora pertencerão oficialmente ao reino castelhano. Por seu turno, o rei de Castela e Leão, Fernando IV, compromete-se a entregar aos portugueses as praças ou os castelos de Campo Maior, Olivença, Ouguela e São Félix dos Galegos, bem como reconhece o domínio português na região da margem esquerda do Guadiana, onde se incluiriam Moura, Serpa, Mourão e Noudar. Também as terras de Ribacoa, região situada sensivelmente entre a margem direita do rio Coa e a margem esquerda do rio Águeda, continuariam nas mãos portuguesas.
Escusado será dizer que este tratado não foi escrupulosamente cumprido pelo lado castelhano. É verdade que Campo Maior e Ouguela foram entregues aos portugueses, integrando hoje os domínios do Alentejo e Portalegre respectivamente, mas o mesmo não podemos dizer de Olivença e de São Félix dos Galegos que, em consequência de inúmeras vicissitudes, nunca chegaram a integrar os domínios definitivos do reino de Portugal.
Todavia, não se julgue que o Tratado de Alcanizes foi um fiasco para Portugal. Pelo contrário, permitiu ao rei português uma paz estável com Castela, a qual poderia durar até 40 anos. Assim sendo, o soberano português poderia concentrar-se exclusivamente na organização administrativa e no desenvolvimento económico do seu reino. A prosperidade exige estabilidade, e na Idade Média, a estabilidade nascia através de tratados entre potenciais estados rivais.
E Portugal definia assim as fronteiras que ainda hoje permanecem intactas, sendo aquelas as mais antigas do Mundo.




Gravura que exibe o documento do Tratado de Alcanizes (1297)
Direitos de Imagem: RTP Ensina


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Curiosidades Históricas XXIV - O Enigma em torno da lendária Escola Náutica de Sagres

Ao longo de muito tempo, se escreveu em vários livros e artigos que o Infante D. Henrique havia criado uma Escola Náutica em Sagres no decurso do século XV. Muitos alegaram inclusivamente o papel fundamental desenvolvido por esta escola que serviria para conceder formação a navegadores, tanto portugueses ou estrangeiros, que assim adquiriam preciosos conhecimentos nas áreas da cartografia, geografia, matemática e astronomia/cosmografia.
Todavia, e de acordo com averiguações modernas, tudo não terá passado de um mito. Não existem sequer quaisquer evidências arqueológicas que confirmem a existência de uma grandiosa escola náutica em Sagres que tivesse catapultado Portugal para o sucesso nos descobrimentos.
É certo que em 1443, o infante D. Henrique irá pedir ao seu irmão, o regente D. Pedro, a concessão da região de Sagres para ali fundar uma vila, onde todos os navegadores poderiam receber apoios ao nível de mantimentos e abrigos. No entanto, e apesar da vila ter sido construída, em nenhum momento é referida, na documentação do século XV, a existência de uma escola náutica naquele povoado algarvio.
De acordo com o historiador Duarte Leite, terá sido Samuel de Purchas, escritor e clérigo inglês, que foi o construtor de tal mito no ano de 1625, história que acabaria posteriormente por ser difundida na Europa inteira e validada acriticamente como verdadeira. Era pois uma questão de tempo até que escribas e cronistas portugueses adoptassem também esta versão dos acontecimentos.
Contudo, as investigações mais recentes viriam a refutar a tese de uma escola náutica em Sagres. Não foram encontradas ruínas, documentos ou artefactos em Sagres que remetessem para essa hipótese. Nem sequer os primeiros biógrafos do Infante D. Henrique fizeram alusão à sua existência.
Sabemos sim que terá existido uma escola náutica portuguesa, não em Sagres, mas sim noutra povoação algarvia - Lagos. Aqui sim, terá sido visível um movimento que, após décadas de explorações marítimas, acabou por reunir informações náuticas determinantes que assim contribuíram para as grandes façanhas da expansão marítima portuguesa.
A Escola Náutica de Sagres não terá passado de uma lenda que foi alimentada por historiadores estrangeiros, por escritores portugueses posteriores e ainda em manuais de história adoptados nas escolas, contudo não existem factos da época que concretizem de forma inequívoca a presença deste equipamento ou estrutura de excelência.
No entanto, a sua inexistência não afecta, em momento algum, os méritos e os elevados conhecimentos que os portugueses assimilaram sobre os oceanos, mares e rios de então, desvendando novas terras e povos, como nunca antes havia acontecido!




O Infante D. Henrique foi um grande impulsionadores dos Descobrimentos Portugueses.
Imagem retirada de: https://historiazine.com/


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Curiosidades Históricas XXV - O Desastre de Tânger

O Desastre de Tânger, ocorrido em 1437, foi um dos maiores fiascos militares de Portugal no Norte de África, aquando dos seus planos de expansão.
Os portugueses tinham tomado Ceuta em 1415, pelo que procuravam agora consolidar a sua presença em Marrocos, conquistando novas praças.
Tal como Ceuta, Tânger era uma praça costeira que oferecia uma localização estratégica vantajosa no Estreito de Gibraltar. O infante D. Henrique demonstrou, desde cedo, o seu interesse em conquistar tal região. Refira-se que o projecto militar do infante esteve longe de ser consensual. Dentro da ínclita geração, os seus irmãos, o príncipe (e depois rei) D. Duarte, o infante D. Pedro, duque de Coimbra, o Infante D. João, Duque de Reguengos, e seu o meio-irmão D. Afonso, Conde de Barcelos, demonstraram as suas renitências sobre um eventual ataque de grande envergadura contra as possessões do então sultanato merínida de Marrocos. Mas o infante D. Henrique continuou a pressionar o rei D. Duarte, conseguindo ainda convencer o seu irmão mais novo Fernando, posteriormente apelidado de infante santo, a juntar-se à sua causa. Os infantes D. Henrique e D. Fernando haveriam de conseguir o que desejavam, mas iriam arrepender-se da decisão para o resto das suas vidas. Um pelos remorsos, o outro pelo cativeiro excruciante.
Em Agosto de 1437, as tropas portuguesas lideradas pelos dois infantes e estimadas num total de entre 7 a 8 mil soldados, deixaram Lisboa, e pouco tempo depois, chegaram a Ceuta, praça dominada pelos portugueses, para depois encetarem uma marcha terrestre rumo a Tânger (embora o infante Fernando ficasse incumbido de comandar a frota naval pela costa marítima). Durante o caminho, ainda tentaram uma investida contra Alcácer Ceguer mas encontraram uma sólida resistência, pelo que continuaram a jornada até Tânger.
No dia 13 de Setembro, chegaram a esta praça, iniciando o cerco. O infante D. Henrique mandou montar um acampamento militar o qual era protegido parcialmente por uma paliçada de madeira (com 2 metros de altura), fossos e estacaria, contudo ele subestimaria ou desvalorizaria os conselhos do rei D. Duarte que favoreceriam um assentamento estratégico em pleno areal de forma a terem acesso rápido aos navios e ao apoio da armada então ancorada. O rei D. Duarte tinha aconselhado ainda o seu irmão infante D. Henrique a retirar-se do cerco de Tânger caso não conquistasse a praça na primeira semana, dado que temia a chegada de um exército marroquino de socorro.
No dia 20 de Setembro acontece a primeira ofensiva contra os muros de Tânger. O infante D. Henrique liderava pessoalmente um dos cinco grupos de assalto. Contudo, os portugueses sofrerão duas ou três dezenas de baixas mortais e centenas de feridos. A artilharia portuguesa não era ainda suficientemente poderosa para abrir brechas nas muralhas, e as escadas de assalto, além de serem poucas, possuíam altura insuficiente para abordar as defesas de Tânger. No dia 30 de Setembro, e duas semanas depois do início do cerco, um grande exército muçulmano, estimado pelos cronistas portugueses em cerca de 100 mil homens (número talvez exagerado), chegaria em auxílio da praça moura cercada. 50 ginetes (cavaleiros de elite) que estavam às ordens de Rui de Sousa, alcaide-mor do castelo da Vila de Marvão, morrem nas primeiras escaramuças com o inimigo.
No dia 3 de Outubro, e após algumas manobras tácticas inconclusivas, o infante D. Henrique ordenou às suas forças que atacassem os flancos do exército mouro, tendo mesmo provocado a retirada do invasor inimigo. Ao mesmo tempo, os portugueses sofreram uma sortida das forças provenientes de Tanger que procuravam apoderar-se do acampamento militar português que estava descompensado devido ao ataque empreendido pelo infante. Contudo, o fidalgo Diogo Lopes de Sousa (mordomo-mor e conselheiro do rei) e o seu destacamento foram suficientes para anular este ataque inesperado, assegurando a defesa do arraial.
A 5 de Outubro, os portugueses conduziram um segundo assalto às muralhas de Tânger, contando com melhores escadas de acesso, com um poder reforçado de artilharia e com uma torre de cerco munida por dois canhões. Agora os confrontos serão mais duros e intensos, mas a guarnição moura, com recurso a pesadas cargas e flechas incendiárias, conseguiu uma vez mais levar a melhor.
A 9 de Outubro, Henrique encontrava-se a preparar o terceiro assalto, quando foi surpreendido pela chegada de um novo poderoso exército muçulmano liderado por Abu Zacarias Iáia Aluatassi, vizir do sultão merínida de Fez. Muitos governadores e reis mouros integravam a liderança deste exército marroquino unido que teria ainda uma dimensão superior à do anterior exército mouro de auxílio. Temendo a impossibilidade de derrotar este inimigo e já havendo deserções no lado luso, o infante D. Henrique planeia uma retirada organizada, contudo não terá tempo para a fazer, já que o inimigo investirá imediatamente sobre as forças nacionais. Os portugueses perderam os seus postos de assalto mais avançados, viram ser apreendidas ou destruídas as suas baterias (engenhos) de artilharia, e como se não bastasse, a fome e o desespero apoderaram-se do acampamento português. O Infante D. Henrique testará, ainda assim, as linhas do inimigo, mas não tem forças suficientes para os derrotar. O seu cavalo é atingido fatalmente em combate. Apeado, o infante só não tomba (ele que viria a ser nas décadas seguintes o cérebro da primeira era dourada dos Descobrimentos Portugueses) porque heroicamente Fernão Álvares Cabral e um grupo de companheiros vieram em seu socorro.
O bispo português de Ceuta corria de um lado para o outro, incentivando os soldados a resistir em honra da salvação final, absolvendo ainda os combatentes moribundos dos seus pecados em vida.
Muitos portugueses refugiam-se num palanque de madeira pré-fabricado, situado perto da praia, mas em breve ficarão sem acesso a mantimentos e água, enquanto são atacados recorrentemente pelo inimigo.
Impotentes e já com muitas baixas sofridas, os portugueses negociaram a rendição a 12 de Outubro, tendo ficado as conversações concluídas (e rubricadas) entre os dias 16 e 17 de Outubro de 1437. Os marroquinos permitiram a retirada do exército português (ou melhor, do que restava do corpo expedicionário) para os seus barcos, mas de mãos vazias, isto é, sem levarem consigo quaisquer tipo de armas, enquanto os portugueses se comprometeriam a devolver Ceuta em breve.
Portugueses e Marroquinos trocaram reféns que só seriam libertados quando cada lado cumprisse a sua parte. Como se sabe Portugal nunca devolveria Ceuta, pelo que Fernando, o Infante Santo, o principal refém escolhido de entre os portugueses para o cumprimento dessa cláusula, viveria o resto da sua vida em cativeiro, causando um interminável desgosto nos seus irmãos infante D. Henrique, que saiu intacto do episódio de Tanger, e D. Duarte, rei de Portugal que, não escondendo a amargura, seria sempre pressionado pelo conselho real e pela alta aristocracia a não abdicar de Ceuta em contexto algum.
Apesar do registo de quatro tentativas falhadas, Tânger seria finalmente tomada pelos portugueses no ano de 1471, na altura do reinado de D. Afonso V.




Direitos de Imagem: Gravura de Tânger, datada o séc. XVI, da autoria de Braun and Hogenberg. Neste exemplar, Tânger surgia retratada já como parte integrante do Império Português.


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Curiosidade Histórica XXVI - A Batalha de Arzila

Após o desastre de Tânger em 1437, e contando ainda com a praça de Ceuta no Norte de África, os portugueses lançam-se novamente no teatro de operações marroquino, durante o reinado de D. Afonso V.
O rei português queria vingar o calvário sofrido pelo infante santo D. Fernando, e encarava aquela região como uma fundamental alavanca para a progressão marítima portuguesa. Em 1458, os portugueses tomam Alcácer Ceguer, e em 1471, visarão a importante cidade de Arzila, cuja conquista poderia facilitar um cerco posterior a Tânger que ficaria assim isolada.
Além de tudo isso, Arzila era um dos locais da chegada do ouro proveniente da Guiné. Por outro lado, não era menos verdade que o cenário político era, desta feita, mais favorável para as hostes portuguesas até porque subsistiam naquele momento divergências entre os líderes muçulmanos. Aliás, o governador de Arzila, Mulay Ash-Sheikh, estava ausente da cidade, empenhado num cerco a Fez para tomar o lugar do sultão ali residente.
D. Afonso V organiza uma forte expedição para tomar a praça marroquina. Os portugueses partem de Lagos (Algarve) com uma armada composta por 30 mil homens e 477 navios.
A frota chega à costa de Arzila no dia 20 de Agosto, mas o desembarque não corre da melhor forma. Uma tempestade que então se fez sentir naquele momento implicou a destruição de alguns navios, vitimando mortalmente mais de 200 soldados, incluindo 8 fidalgos. Como se não bastasse, as perdas materiais dificultaram a construção do palanque, estrutura defensiva circular de madeira destinada a proteger o exército, além de que só dois equipamentos de artilharia pesada resistiram aos danos da intempérie.
O ataque começa no dia 21 de Agosto com um grande assalto dos portugueses que, imprimindo o seu poder de fogo (embora condicionado pelo episódio anterior), conseguem criar danos nas muralhas. Os defensores da guarnição estão dispostos a negociar a rendição, mas os portugueses rejeitam. Os muçulmanos resistirão por mais três dias, registando-se baixas importantes de ambos os lados. Muitos moradores inocentes morrerão até que os portugueses controlem a praça de Arzila. Do lado português, sucumbirão igualmente figuras importantes tais como o conde de Monsanto, D. Álvaro de Castro, e o conde de Marialva, D. João Coutinho.
A conquista de Arzila em 24 Agosto de 1471 permitiu aos portugueses a obtenção de 80.000 dobras de ouro e de muitos cativos.
Quando ainda se encontrava em Arzila, D. Afonso V é informado de que os habitantes de Tânger, temendo um massacre idêntico, tinham incendiado e abandonado a sua cidade. O rei português ficou insatisfeito porque seria obrigado a tomar Tânger pacificamente, o que lhe não permitiu concretizar a vingança que ansiava pelo martírio de D. Fernando, o Infante Santo. Assim sendo, em 1471, os Portugueses juntavam Arzila e Tânger às praças anteriormente conquistadas de Ceuta (1415) e Alcácer Ceguer (1458).
Em relação a Arzila, esta praça foi possessão dos portugueses entre 1471 e 1550 e, mais tarde, entre 1577 e 1589.




Direitos de Imagem - Gravura de Arzila no séc. XVI da obra Civitates Orbis Terrarum de Braun e Hogenberg,
Para saber sobre mais o legado português em Marrocos, consulte também a seguinte página: https://historiasdeportugalemarrocos.com/


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Curiosidade Histórica XXVII - A epopeia de Cristóvão Colombo

Cristóvão Colombo nasceu em 1451. Continua a debater-se qual terá o sido local de nascimento. A tese dominante é de que teria nascido em Génova. Mas outros historiadores levantaram a hipótese de ter nascido na Córsega, na Galiza, na Catalunha ou até mesmo em Portugal. Sobre a teoria de um eventual nascimento português, há quem associe Cristóvão Colombo ao concelho alentejano de Cuba ou a Colos, uma freguesia do município também alentejano de Odemira.
De acordo com o National Geographic, Cristóvão Colombo apaixonou-se pelo mar desde cedo. Seria corsário ao serviço de Renato de Anjou (antigo rei de Nápoles e duque da Lorena e de Anjou), trabalharia ainda nas rotas do Açúcar no Mediterrâneo e, com 20 anos de idade, começou a dedicar também o seu tempo à exploração do Oceano Atlântico.
Em 1479, irá contrair matrimónio com a portuguesa Filipa Moniz Perestrelo, filha de um antigo governador de Porto Santo. Cristóvão Colombo terá vivido no arquipélago da Madeira e iniciaria aqui uma reflexão sobre a possibilidade de alcançar a Índia das especiarias através de uma rota ocidental, o que implicava uma travessia exclusiva pelo Oceano Atlântico de forma a alcançar a Ásia.
Cristóvão Colombo apresentaria mesmo o projecto à coroa de Portugal, contudo viria a ser rejeitado por ser considerado de alto risco e por não atender à ideia comum e em voga entre os responsáveis portugueses de que a Índia só seria alcançada por uma rota contrária o que implicava todo um contornar do continente africano.
Após a recusa portuguesa, Cristóvão Colombo virou-se para Castela e apresentou a ideia aos Reis Católicos em 1486. Uma comissão de especialistas rejeitou inicialmente a sua proposta porque alegava que o plano apresentado assentava em cenários impossíveis de comprovar. A conquista de Granada e consequente expulsão dos muçulmanos da Península Ibérica em 2 de Janeiro de 1492 fez com que o optimismo se apoderasse da coroa espanhola que se tornou agora mais receptiva em auscultar potenciais estratégias de natureza ultramarina. O acordo foi só uma questão de dois ou três meses. Os reis espanhóis aceitaram financiar a campanha, ficando Colombo responsável por garantir a soberania espanhola das novas terras descobertas. Segundo o National Geographic, Colombo seria nomeado ainda vice-rei perpétuo e governador de qualquer território que encontrasse, almirante hereditário do Mar Oceano, beneficiário de 10% dos tesouros descobertos e de uma oitava parte dos lucros do tráfico e do comércio.
No dia 3 de Agosto de 1492, Cristóvão Colombo zarpou da região de Huelva, comandando duas caravelas, denominadas a Pinta e a Nina, e uma nau, designada de Santa Maria. Contava com um total de 89 marinheiros. Pelo meio, ainda ancorou nas Canárias. Trinta e três dias depois, no dia 12 de Outubro, e quando a tripulação começava a demonstrar insatisfação de ver tanto mar, Cristóvão Colombo descobriu o ilhéu de Guanahani (baptizado imediatamente de São Salvador), nas Antilhas, porção da América Central que reúne várias ilhas. Colombo percorreria posteriormente o arquipélago das Bahamas e as ilhas de Cuba e do Haiti. Ao início, Colombo achava que tinha chegado finalmente às Índias, mas a verdade é que alcançaria um novo continente que nada tinha a ver com a tão ambicionada rota das especiarias. Aliás, Cristóvão trouxe apenas desta primeira expedição, no seu retorno até Espanha, uma pequena remessa de ouro e pérolas, aves exóticas e sete índios.
Entre 1493 e 1496, Cristóvão Colombo realizou uma segunda viagem onde exploraria melhor os arquipélagos das Antilhas, voltando a interessar-se pelas ilhas do Haiti, Cuba e Jamaica. Estabelecerá também nesta região insular as primeiras bases colonizadoras.
O navegador fará ainda uma terceira viagem entre 1498 e 1500, desembarcando na costa da actual Venezuela. Já nos anos compreendidos entre 1502 e 1504, Cristóvão Colombo empreendeu a sua quarta e última viagem onde explorou as Caraíbas Ocidentais, estando convencido de que a ilha de Cuba era a província chinesa de Bangui e que não deveria estar longe da Índia das especiarias que tanto desejava descobrir. Passou por Martinica, Santo Domingo, Panamá, Jamaica e enfrentou vários temporais. Pouco tempo depois, morrerá a rainha Isabel que tanto o apoiara. A chegada ao trono de Joana, filha dos reis católicos, e do seu marido Filipe irá fazer prevalecer uma mudança de prioridades no que diz respeito à estratégia imediata em torno da expansão marítima que parece ter abrandado.
No regresso, encontrando-se já doente e sem qualquer apoio, Cristóvão Colombo instalou-se no convento franciscano de Valladolid, em Espanha. Morreria a 20 de Maio de 1506, convencido ainda de que havia chegado à India, segundo nos conta o National Geographic.





Cristóvão Colombo chegaria às Antilhas, anunciando oficialmente a descoberta de um novo continente.


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Curiosidade Histórica XXVIII - Gil Vicente, Fundador do Teatro Português

Gil Vicente nasceu por volta de 1465, possivelmente em Guimarães. Gil Vicente viria a ser um dos génios mais notáveis da cultura portuguesa na viragem do século XV para o século XVI, tendo desenvolvido a sua obra durante os reinados de D. Manuel I e D. João III. Considerado como fundador do Teatro em Portugal, criaria diversos autos em que descrevia, de forma satírica, a realidade social do seu país.
A ele seriam atribuídas várias obras e peças nomeadamente: o “Auto da Barca do Inferno”, o “Auto da Visitação” (ou "Monólogo do Vaqueiro"), a “Farsa dos Físicos”, o “Clérigo da Beira”, a “Farsa dos Almocreves”, o “Auto da Índia”, entre outros.
Os seus escritos e interpretações artísticas começavam a causar muito boa impressão na corte real, iniciando assim uma carreira que se estenderia por mais de três décadas e que entreteria a família real e a alta nobreza. Gil Vicente foi escritor, encenador, actor e músico, animando múltiplos serões do paço.
Ao longo da sua vasta obra, Gil Vicente criticou as práticas de vários sectores sociais. A sua sátira, muitas vezes radical, não poupou nobres, clérigos, feiticeiras, alcoviteiras, juízes, médicos, entre outros.
Gil Vicente foi ainda um trovador, tendo redigido poemas que seguiam este estilo em concreto.
Conhece-se melhor a sua obra do que propriamente a sua vida. Alguns historiadores teorizam que Gil Vicente tinha sido um ourives que consumara a criação artística do valioso recipiente da Custódia de Belém, e que, por outro lado, havia ainda estudado na Universidade de Salamanca, mas nenhuma destas histórias foi cabalmente provada.
Sabemos sim que Gil Vicente se casou duas vezes, a primeira vez com Branca Bezerra e a segunda, já na condição viúvo, com Melícia Rodrigues. Do primeiro casamento, teve dois filhos Gaspar Vicente e Belchior Vicente, enquanto que do segundo casamento, resultaram três filhos: Paula Vicente, Luís Vicente e Valéria Borges.
"A rir é que se corrigem os costumes", este foi um dos lemas adoptados por Gil Vicente que manteve sempre um olhar crítico sobre a sua sociedade. Contando com a protecção da coroa, Gil Vicente teve a possibilidade de visar classes privilegiadas, denunciando os seus vícios, a sua hipocrisia e arrogância.
Gil Vicente faleceu em Évora, Portugal, no ano de 1536.




Direitos da gravura apresentada: "O Monólogo do Vaqueiro" apresentado na corte por Gil Vicente. Pintura da autoria de Roque Gameiro.